sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Crase: Nenhum bicho de 7 cabeças

Tem coisa mais chata que acharem erros gramaticais em nosso texto?

Por mais que expliquemos que foi só falta de atenção, o clima tenso persiste.
E a única forma de evitarmos isso é redobrando a nossa atenção.

Eu andei exagerando nas crases (não riam) e fui pesquisar mais sobre o assunto. Precisava achar um jeito de fazer entrar, de uma vez por todas, na minha cabeça mais essa regra chatíssima da língua portuguesa. Pensei que, talvez, fazendo essa postagem, eu forçaria o meu cérebro preguiçoso a gravar quando posso ou não usar a crase.

O texto é longo, mas acho que pode virar nossa referência sempre que tivermos alguma dúvida.

Vamos lá...

Crase é uma palavra de origem grega e significa "mistura", "fusão". 
(não é à toa que essa regra me deixa com os nervos "misturados" rs)

Nos estudos de língua portuguesa, é o nome dado à fusão ou contração de duas letras "a" em uma só. A crase é indicada pelo acento grave (`) sobre o "a".

Assim, apesar do uso corrente, crase não é o nome do acento, mas do fenômeno representado através do acento grave.
A primeira regra prática para descobrir se ocorreu ou não a crase é também a mais simples e mais utilizada:

1ª Regra Prática: Substituia a palavra feminina por uma masculina, de mesma natureza. Se aparecer a combinação ao, é certo que ocorrerá crase antes do termo feminino:

  • Amanhã iremos ao colégio / à escola.
  • Prefiro o Corinthians ao Palmeiras / à Portuguesa.
  • Resolvi o problema / a questão.
  • Vou ao campo / á praia.
  • As crianças foram ao largo / à praça.
A 2° Regra Prática a ser verificada consiste em substituir o termo regente da preposição a por outro que exija uma preposição diferente (de, em, por). Se essas preposições não se contraírem com o artigo, ou seja, se não surgirem as formas da(s), na(s) ou pela(s), não haverá crase:
  • Refiro-me a você. (sem crase) (Gosto de você / Penso em você / Apaixonei-me por você.)
  • Refiro-me à menina. (com crase) (Gosto da menina / Penso na menina / Apaixonei-me pela menina.)
  • Começou a gritar. (sem crase) (Gosta de gritar / Insiste em gritar / Optou por gritar.)
Mais uma regra que deve ser verificada é a de substituir verbos que transmitem a idéia de movimento (ir, voltar, vir, chegar etc.) pelo verbo voltar. Ocorrendo a preposição "de", não haverá crase. E se ocorrer a preposição "da", haverá crase:
  • Vou a Roma. / Voltei de Roma.
  • Vou à Roma dos Césares. / Voltei da Roma dos Césares.
  • Voltarei a Curitiba e à Bahia. / Voltarei de Curitiba e da Bahia.
A última regra deve ser usada no caso de locuções, ou seja, reunião de palavras que equivalem a uma só idéia. Se a locução começar por preposição e se o núcleo da locução for palavra feminina, então haverá crase:
  • Gente à toa.
  • Vire à direita.
  • Tudo às claras.
  • Hoje à noite.
  • Navio à deriva.
  • Tudo às avessas.
No caso da locução à moda de, a expressão "moda de" pode vir subentendida, deixando apenas o "à" expresso, como nos exemplos abaixo:
  • Sapatos à Luiz XV.
Mas cuidado:

De acordo com a normal culta, em "bife a cavalo" e "frango a passarinho", as expressões "moda de" ou "maneira de" não estão implícitas ou subentendidas e, assim, o a não recebe o acento indicativo da crase, já que precede palavras masculinas.
  • Bife a cavalo: bife com um ou mais ovos fritos por cima
  • Frango a passarinho: frango picado em pequenos pedaços
No caso de locuções relativas a horários, somente no caso de horas definidas e especificadas ocorrerá a crase:
  • À meia-noite.
  • À uma hora.
Atenção agora! Achei essa parte super interessante. Quando Não devemos usar crase:

Não haverá crase antes de nomes masculinos:
  • Tenho um fogão a gás.
  • Assisti a jogos memoráveis.
  • Fui a pé.
  • Venho a mando de meu patrão.
  • Escreveu um bilhetinho a lápis.
Não haverá crase antes de verbos:
  • A partir da meia-noite, os alunos saem a passear.
  • Começou a chorar.
  • Cheguei a insistir.
Não haverá crase antes de pronomes em geral:
  • Mostre a ela.
  • Disse a mim.
  • Parabéns a você.
Não haverá crase antes de pronomes de tratamento. Se aparecer Vossa, por exemplo, troque por Você e analise:
  • Refiro-me a Vossa Excelência. - Refiro-me a você.
Antes de pronomes indefinidos também não haverá crase:
  • Ele não se prendia a nenhuma mulher.
  • Ele havia declarado amor a certa jovem.
Não haverá crase antes de palavras femininas repetidas:
  • Entraram duas a duas.
  • Estiveram cara a cara.
  • Viram-se frente a frente.
Em geral, não haverá crase antes de nomes próprios de cidades. Entretanto, se o nome da cidade vier determinado, poderá haver crase se a preposição a também estiver presente:
  • Meus advogados retornarão a Brasília em breve.
  • O jovem arquiteto referia-se à monumental Brasília.
Não haverá crase antes da palavra "casa". Entretanto, se a palavra "casa" vier determinada, também poderá haver crase:
  • Fui bem recebido, mesmo tendo chegado tarde a casa.
  • Maria foi à casa da irmã para fazer um empréstimo.
Não haverá crase antes de palavras femininas no plural precedidas de um a. Nesses casos de palavras femininas no plural precedidas de um a, este a é preposição, e os substantivos estão sendo usados em sentido genérico.
  • Não vou a festas.
  • A pesquisa não se refere a mulheres casadas.
  • O prêmio só foi concedido a cantoras nacionais.
Quando são usados em sentido específico, passam a ser precedidos do artigo as e, então, ocorrerá a crase. Compare as frases abaixo:
  • O estudo não se aplica a pessoas de índole nervosa.
  • O estudo não se aplica às pessoas de que estávamos falando.
  • Você está se referindo a secretárias?
  • Você está se referindo às secretárias desta empresa?
Não haverá crase antes de nomes de parentesco, precedidos de pronome possessivo:
  • Recorri a minha mãe.
  • Faremos uma visita a nossa tia.
  • Peça desculpas a sua irmã.
Não haverá crase antes de nomes próprios que repelem o artigo:
  • Rezo a Nossa Senhora.
  • O guerreiro falou a Iracema.
  • Fiz uma promessa a Santa Teresinha.
  • Iremos a Curitiba e depois a Londrina.
Não haverá crase antes do substantivo terra, em oposição a bordo, a mar:
  • Saiu do navio e chegou a terra.
  • Vendo o tubarão, o nadador voltou logo a terra.
Não haverá crase antes de numerais cardinais referentes a substantivos não determinados pelo artigo. Mas lembre-se: como vimos anteriormente, usa-se a crase nas locuções adverbiais que exprimem hora determinada. Ainda, usa-se a crase nos casos em que o numeral estiver precedido de artigo.
  • Assisti a duas sessões.
  • Daqui a três semanas muita coisa terá mudado.
  • A fazenda ficava a quatro léguas da cidade.
  • Chegamos às nove horas da manhã.
  • Assisti às duas sessões de ontem. 
A crase é facultativa diante dos nomes próprios de pessoas, antes de possessivos e depois da preposição até que antecede substantivos femininos, desde que o termo antecedente reja preposição a:
  • Ofereci um presente a (à) Carolina.
  • O porteiro entregou os papéis a (à) minha secretária.
  • Irei a (à) vila.
  • Enviei flores a (à) Paula.
Se o "a" antes de "que" significar aquela, aquelas, o a poderá ter crase:
  • Não me refiro a esta pessoa, mas sim à que esteve aqui hoje.
Algumas expressões adverbiais de lugar formadas por nomes de cidades, estados e países aceitam o uso do artigo definido feminino. Nesses casos, se houver também a presença da preposição a, haverá crase. Você poderá fazer a verificação da ocorrência do artigo definido feminino por meio da troca do termo regente:
  • Vou à Bahia (Vim da Bahia / Estou na Bahia)
  • Vou a Florença. (Vim de Florença / Estou em Florença)
A ocorrência da crase com os pronomes aquele(s), aquela(s) e aquilo depende apenas da verificação da presença da preposição que antecede esses pronomes:

  • Veja aquele monumento / aquela praça / aquilo. (O verbo ver é transitivo direto, portanto, não há preposição)
  • Refiro-me àquele jardim / àquela praça / àquilo. (O verbo referir-se é transitivo indireto e rege a preposição a)
A crase com o pronome a qual é detectável pelo expediente da substituição do termo regido feminino por um termo masculino:

  • A professora à qual devo meu aprendizado já se aposentou.
  • O professor ao qual devo meu aprendizado já se aposentou.
  • Muitas das alunas às quais ele dedicou seus estudos estiveram presentes à homenagem de ontem.
  • Muitos dos alunos aos quais ele dedicou seus estudos estiveram presentes à homenagem de ontem.
Em algumas locuções adverbiais femininas, ainda que não haja, a rigor, uma fusão entre o "a" preposição e o "a" artigo (já que existe apenas o "a" preposição), muitos gramáticos consideram aceitável (e alguns acham até mesmo preferível) o uso do acento indicativo da crase no "a".
A justificativa é buscar a forma que dê maior clareza à frase. Veja:
  • Eu estudo a distância. (Que distância você estuda?)
  • Eu estudo à distância. (Ah! Você estuda pela internet, não é?)
  • Foi caçada a bala. (É a bala que foi caçada?)
  • Foi caçada à bala. (Coitada... Será que tomou algum tiro?)
  • Bateu a máquina. (Será que ele bateu o carro?)
  • Bateu à máquina. (Usando a máquina de escrever até hoje, hein?)

Eu disse que era longo... rs

Mas espero que os ajude tanto quanto ajudou a mim. (haha, não usei a crase porque está antes de um pronome! \o/)

Até à próxima. (usei crase por ser uma locução, rs)
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4 comentários:

Evana R. disse...

Crase é um negócio bem trabalhosinho no começo, mas depois que aprendi, não esqueci mais! heheh
Ficou muito bacana o tutorial :)
Abraços

Adriana Brazil disse...

ótima dica Nanda! Eu tb tenho a mania de colocar onde não tem, mais foi ótima a explicação! Gostei!

Nanda Meireles disse...

É verdade, Evana, parece bem trabalhoso, mas se atentarmos sempre para algumas regrinhas básicas, as dúvidas vão se esvaindo e acabamos aprendendo definitivamente, rs.

Valeu, Dri. Temos que perder essa mania urgente! rs

Beijos, meninas.

D + D disse...

parabéns pelo artigo...me ajudou bastante.

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